quarta-feira, 20 de março de 2013

A Esclerose múltipla e a vitamina D em 5 questões

O que é a vitamina D?
A vitamina D é uma substância sintetizada na pele, sob acção dos raios ultravioletas do sol, a partir do colesterol. Alguma, pouca, vitamina D provém também da alimentação, sobretudo de alimentos enriquecidos (cereais de pequeno almoço, margarina) e dos peixes gordos (salmão, sardinha). Para exercer a sua acção, a vitamina D precisa ainda ser transformada no fígado e no rim para originar 1,25(OH)2D3 (vitamina D activa). A função melhor conhecida da vitamina D activa é a absorção de cálcio do intestino. No entanto a vitamina D tem também outras acções, incluindo a regulação das células imunes, sendo este o motivo que a torna interessante no âmbito da esclerose múltipla.

 Quais a necessidades diárias de vitamina D?
A vitamina D, ao contrário de todas as outras vitaminas, é produzida em grandes quantidades pelo nosso organismo. Calcula-se que, em pessoas de pele clara, meia hora diária de exposição da cara e braços ao sol, sem protecção, seja suficiente para cobrir as necessidades. No entanto, alguns de nós poderão não atingir estes mínimos, seja por vivermos em países com menos horas de sol, pela utilização mais frequente de protectores e filtros solares, pela vida mais no interior dos edifícios, pela cor da pele ou pela idade. Nesse caso, a alimentação também não é suficiente, pois a quantidade de vitamina D presente nos alimentos é escassa (ver acima). Assim, pode ser necessária uma suplementação adicional com vitamina D. No entanto, as recomendações da Organização Mundial de Saúde quanto às necessidades diárias de vitamina D (estimadas em 15ug = 600UI) e o valor que deve ser ingerido diariamente (5 a 10ug = 200 a 400UI, conforme a idade) foram calculadas com base na acção da vitamina D no osso, descurando por completo as suas acções noutros órgãos. Deste modo, é possível que sejam necessárias doses maiores para um funcionamento adequado do sistema imunitário, por exemplo.  

Como posso saber se tenho vitamina D suficiente?
É possível medir a vitamina D no sangue, mas tal como para as necessidades diárias, os valores mínimos apenas foram estabelecidos tendo em conta a saúde dos ossos, pelo que a interpretação dos resultados pode ser difícil. Embora o testes variem de laboratório para laboratório, é consensual que valores inferiores a 25 nmol/L (10ng/ml) prejudicam a deposição de cálcio nos ossos e levam ao raquitismo e osteomalácia, sendo portanto este valor considerado o limite da deficiência em vitamina D. No entanto, a prevenção da osteoporose e da saúde óssea parece necessitar de níveis de vitamina D superiores a 50nmol/L, considerado o limiar da insuficiência em vitamina D, havendo mesmo evidência da necessidade de se manterem valores superiores a 75nmol/L (30ng/ml). De notar que, embora menos estudados, níveis nesta ordem de grandeza poderão também ser importantes para algumas das outras funções da vitamina D, incluindo a esclerose múltipla (ver a seguir). Outro modo de saber se há vitamina D suficiente é medir os níveis de paratormona (PTH). A PTH é uma hormona produzida pelas glândulas paratiróides (ao lado da tiróide, no pescoço), cuja função é manter os níveis adequados de cálcio no sangue. Se não houver vitamina D suficiente para absorver cálcio do intestino, a paratormona aumenta para compensar, promovendo a reabsorção de cálcio do osso e no rim.  

Qual a relação entre vitamina D e esclerose múltipla?
A vitamina D é capaz de regular o funcionamento das células imunitárias, que expressam o seu receptor, e, em modelos animais de esclerose múltipla, o tratamento com vitamina D foi capaz de melhorar o curso da doença. Além disso, níveis mais elevados de vitamina D diminuem o risco de sofrer de esclerose múltipla, enquanto alterações genéticas na enzima que converte a vitamina D na sua forma activa aumentam aquele risco. Nesta linha, seria razoável supor que níveis elevados de vitamina D poderiam afectar o curso inicial da doença, o que tem sido difícil de demonstrar. Na realidade, a mais recente evidência, ainda com alguns resultados contraditórios, mostra apenas que níveis maiores de vitamina D parecem estar associados a menos lesões novas na ressonância ou a menor risco de surtos, mas comparando níveis adequados de vitamina D com níveis insuficientes. Em resumo, os dados mais recentes sugerem que, além de fazer bem ao osso, níveis “normais” de vitamina D (>75nmol/L – 30ng/ml) parecem fazer bem à esclerose múltipla e devem ser atingidos em todos os pacientes. Contudo, não se sabe se níveis “ muito altos de vitamina D (>125nmol/L – 50ng/ml) trazem um benefício acrescido, havendo até um estudo que sugere o contrário, pelo que o seu uso deve ser cauteloso.  

Devo tomar vitamina D?
Tal como acabamos de ver, depende. Se os seus níveis de vitamina D forem inferiores ao considerado necessário (>75nmol/L – 30ng/ml) é razoável que tome um suplemento adequado para os trazer para valores “normais”. No entanto, até ao presente, e exceptuando informações pouco rigorosas e relatos de disponíveis na Internet, não há evidência científica de que a suplementação com vitamina D em pessoas com níveis adequados (>75 a 100nmol/L – 30 a 40ng/ml) seja benéfica para a doença. Tal como todos os medicamentos, a toma de vitamina D em excesso pode ser extremamente prejudicial para o doente, sobretudo pelo aumento dos níveis de cálcio no sangue, que podem causar litíase (“pedra”) nas vias urinárias, danificando os rins, ou interferir com a função muscular e a condução nervosa. Tendo em conta estes dados, recomendamos sempre que discuta com o seu médico assistente antes de começar a tomar qualquer suplemento, incluindo os que contêm vitamina D.

Texto publicado na revista da associação "Todos com a esclerose mútlipla" Dezembro de 2012.

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